sexta-feira, novembro 04, 2005

Egrégia disciplina

Vasco Pulido Valente, na sua habitual coluna da última página do jornal Público, desenha com palavras retratos caricaturais do país, os quais, à semelhança das boas caricaturas pictóricas, exageram nos traços mas acertam na âmago. É uma das colunas que gosto de ler diariamente.

No exercício de hoje VPV atira-se aos candidatos presidenciais Soares e Cavaco, esmifrando um e outro com pinceladas rápidas. A "desconstrução" de Soares é um pouco mais elaborada, e percebe-se porquê: o retratado é do universo das humanidades, de onde VPV também descende. O desenho de Cavaco é mais difícil e a sua caricatura menos conseguida, pois VPV não penetra sequer - como a maioria dos "cultos" - nos meandros da Economia. Resta-lhe portanto o traço grosso: os economistas não lêm livros e são ignorantes. Tem graça e não ofende (a mim, não), e aqui fica:
«Cavaco, esse, veio de um meio relativamente pobre e, presumo, apolítico; e ficou confinado, por necessidade ou falta de estímulo, à sua profissão. Além disso, achava (e não faço ideia se ainda acha) o pensamento económico mais do que suficiente para explicar o mundo, no que aliás não se distingue da generalidade dos seus colegas, uma classe particularmente pouco lida e intelectualmente limitada. Só depois, tarde na vida e já primeiro-ministro, descobriu que existia uma realidade irredutível à sua egrégia disciplina. E mesmo assim volta sempre à origem, como, por exemplo, na famosa metáfora da boa e má moeda, que ajudou a liquidar Santana.»
A propósito: é "metáfora" ou "analogia"? Eu creio que é analogia - mas isso é talvez ignorância minha, que sou economista. Seja como for, num ou noutro caso, não passa de uma regra-de-três-simples.