sábado, dezembro 25, 2004

Leituras sobre Jesus Cristo


Ao longo deste ano tive oportunidade de participar em interessantes debates online sobre "O Código Da Vinci". Considero este livro uma especulação incompetente e oportunista sobre algo que, com fundamento, preocupa e atrai as nossas mentes: quem foi realmente Jesus Cristo?

Creio que esta inquietação tem duas vertentes: uma mais directamente ligada ao homem que Jesus foi; outra mais relacionada com a natureza da religião: teria sido o Cristianismo actual a religião verdadeiramente propagada por Cristo?

Eu estou convencido que o Cristianismo actual é muito diferente, em muitos aspectos, daquilo que o próprio Cristo ensinou, mas acho isso normal e positivo. O Cristianismo primitivo era apenas uma variante do Judaismo, uma variante algo exarcebada e nem sequer muito original (outros profetas tinham antes divulgado ideias que Cristo retomou) mas com um aspecto que se viria a revelar revolucionário: a ideia de que todos são iguais perante Deus. Cristo ensinava-o e praticava-o - o que não era muito bem aceite naquela sociedade hierarquizada, onde os judeus nem sequer estavam no nível mais baixo.

Teriam de passar séculos até que essa ideia conseguisse prevalecer na sociedade como conduta a seguir (embora na prática muitas vezes não o seja). Quanto ao resto da teologia que a Igreja católica foi desenvolvendo, não pode ser considerada como um afastamento da ideias originais de Cristo, mas sim uma adaptação a uma sociedade em mudança e cada vez mais complexa em termos sociais.

Todas as organizações religiosas são conservadoras, mas a Igreja Católica e as Ingrejas Cristãs em geral são das que melhor souberam responder aos desafios dos tempos de mudança.

Por isso, essa febre de querer procurar o verdadeiro Cristo para confrontar (e "desmascarar") a Igreja Católica é uma busca vã. O corpus da teologia deve ser aceite como produto histórico; pode e deve ser questionado, com sempre o foi, mas em função das necessidades espirituais do presente e dos fundamentos lançados por Jesus Cristo - não na confrontação com aspectos anedóticos ou chocantes da vida do "filho do Homem", supostamente secretos e mantidos latentes, ao longo dos séculos, por seitas secretas (a tal "tese" do "Código Da Vinci").

No entanto, acho interessante a busca da verdadeira vida de Jesus, enquanto homem da História, nosso antepassado. Sobre isto recomendo o livo de E. P. Sanders, "A Verdadeira História de Jesus". É um relato diferente da visão adocicada da actual catequese, mas é um relato sério, baseado na própria Biblia e noutras fontes credíveis.

Sou ateu. Ou melhor: agnóstico. Mas respeito muito a religião católica e a sua Igreja. Foram fundamentais na formação do nosso país e da nossa sociedade e creio que continuam a ser. Por isso fiquei muito satisfeito por encontrar o livro, que ando agora a ler, de outro não-crente, o filósofo Fernando Savater, com o título "Os Dez Mandamentos no Século XXI", dedicado a «tentar explicar como os dez mandamentos afectam as pessoas de hoje».

No blog Travessias encontrei este extracto:
«Todavia, nós, os não-crentes, acreditamos nalguma coisa: no valor da vida, da liberdade, e da dignidade, e que o gozo dos homens está nas mãos deles e de mais ninguém. São os homens que devem enfrentar com lucidez e determinação a sua condição de solidão trágica, porque é essa instabilidade que abre caminho à criação e à liberdade.»
Na página da Professora Lucília Nunes encontrei, também acerca do livro de Savater, estes comentários:
«Dei de caras com o novo livro de Fernando Savater e não pude evitar um sorriso para o título: «Os Dez Mandamentos no século XXI. Tradição e actualidade do legado de Moisés» (Dom Quixote, Novembro 2004). Folheei-o, e encontrei discussões do autor com Deus e com Moisés, numa perspectiva de releitura das Tábuas da lei, à luz do nosso tempo e da sociedades em que vivemos.»

«Diálogo do filósofo com o Senhor», a propósito do 1º mandamento.
«O escritor tem uma troca de opiniões com o Senhor» a propósito do 2º.
«O autor tem uma discussão laboral com Deus», em torno do 3º.
«O Senhor, que se considera pai de tudo e de todos, escuta algumas reflexões do autor», acerca do 4º.
«Iavé escuta em silêncio as acusações do Sr. Savater», por causa do 5º.
«Iavé e Savater têm uma conversa sobre sexo», em torno do 6º.
«O autor pede a Deus que o esclareça sobre o que significa roubar», a propósito do 7º.
«Iavé e o filósofo pedem que não mintamos uns aos outros», em relação ao 8º.
«O autor diz que não desejar a mulher do próximo é uma antiguidade, e Iavé fica contrariado», em relação ao 9º.
Finalmente, «O autor e Iavé analisam as dificuldades de fazer cumprir este mandamento», que é o 10º.

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