sexta-feira, novembro 12, 2004

O valor (económico) de estar vivo


Um estudo realizado em 2003 por Gary Becker, Tomas Philpson e Rodrigo Soares, The Quantity and Quality of Life and the Evolution of World Inequality, tenta avaliar a convergência entre os países, ao longo das últimas décadas, incorporando a longevidade num conceito de “rendimento global” (”full” income). A conclusão é a de que os países que partiram (em 1965) com um menor rendimento, cresceram mais em termos deste “rendimento global” dos que os países mais desenvolvidos. A taxa média de crescimento foi de 140 % para os países desenvolvidos, contra 192 % dos países em desenvolvimento.

Donde surge este aparente paradoxo? A evidência mostra que, entre os diferentes países, existe convergência na longevidade, embora ela não ocorra no rendimento per capita. Como também existe uma correlação positiva entre a longevidade e o rendimento per capita, aquela relação deve estar a mudar ao longo do tempo. Ou seja: a longevidade aumenta para certos níveis de rendimento, e este aumento tem sido maior em países mais pobres.

O estudo apresenta ainda, para o conjunto de países analisados, quais as principais causas de morte em termos de influência nesta convergência. Para calcular o valor económico dos ganhos de longevidade e a sua decomposição para cada causa de morte, o estudo recorre ao rendimento per capita, às taxas de sobrevivência, a uma forma especial da função de utilidade (ou seja, a disponibilidade para pagar pela extensão da esperança de vida) com duas dimensões: a substituibilidade do consumo em diferentes períodos de vida (ou elasticidade de substituição inter-temporal) e o valor de estar vivo relativamente a estar morto. Doenças infecciosas, respiratórias e do sistema digestivo, condições congenitais e peri-natais e outras “mal definidas”, ocupam os primeiros lugares.

Os economistas têm esta tendência para quantificar, em termos monetários, aspectos como o valor económico de estar vivo, ou de viver mais uns anos. O estudo refere uma outra investigação (The economic value of medical research) que avaliou o valor agregado da variação média anual da esperança de vida nos EUA entre 1970 e 1990, tendo obtido uma estimativa que corresponde a mais de metade do valor do PNB real de 1980. Apesar do aspecto desagradável, ou pouco romântico, desta valorização monetária da vida, tais cálculos são úteis para ponderar e ajudar a escolher os investimentos públicos em termos da sua utilidade objectiva.

Relativamente às conclusões do estudo de Becker, pode-se argumentar que viver mais tempo não significa viver melhor – embora a maioria das pessoas pareça valorizar mais a longevidade do que a saúde imediata. Creio que uma opção de escolha faustiana entre “viver mais” ou “viver melhor” daria vantagem à primeira. O que prefeririam os povos: maior rendimento per capita ou maior esperança de vida? E você?

Deixem-me adivinhar: ambas as coisas, não é?

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