sexta-feira, setembro 09, 2005

Os fins não justificam os meios

Via o Causa Liberal, o texto de Robert Wutscher, "Foundations in economic methodologies: The use of mathematics by mainstream: economics and its methodology by Austrian economics" (pdf), sobre as diferenças de metodologia entre a "corrente principal da Economia" e a Escola Austríaca - e as consequências teóricas dessa diferença.

Neste texto - dum assumido admirador de Menger e Mises - a modelização matemática não é apenas considerada dispensável: é considerada prejudicial porque induz o investigador a seleccionar, isolar e valorizar, do material em estudo, apenas os elementos susceptíveis de medição quantitativa. É curiosa a afirmação de que o que interessa são os meios (o modo como a realidade opera) e não os fins (os resultados de aplicação normativa). Ou seja: os fins não justificam [a selecção e isolamento de] os meios. Citação (tradução minha):
«Este paper descreve como é que o conteúdo dos objectos da realidade são moldados [shaped] ou desembrulhados [unpacked] e usados, de modos muito diferentes, pelas duas metodologias. No paradigma principal da Economia, os objectos da realidade são essencialmente moldados numa forma subordinada [amenable] à análise quantitativa, e portanto tentando estabelecer o seu conteúdo mensurável, real ou em termos abstractos. A ordem (1) é imposta à realidade pelo investigador.

«No paradigma da escola Austríaca, distingue-se o conteúdo material dos objectos da realidade da forma das suas relações no contexto da acção intencional. Apenas desta forma é possível chegar a uma teoria geral da acção humana que seja independente do tempo e do espaço e, portanto, que não seja influenciada por valores nem seja normativa. A ordem - a atribuição de significado a fenómenos tais como a moeda, o capital, o lucro e o prejuízo - é imposta à realidade pelos agentes económicos e deve ser encontrada no seio da realidade pelo investigador. A remoção da desordem envolve a separação do conteúdo material dos fins, que são dependentes do tempo e do espaço, de modo a chegar-se a leis universais, que estão relacionadas com os meios.»
Mas este problema não seria exclusivo da Economia. Depois de afirmar que a teoria da gravitação de Newton "não preenchia o critério mecânico para uma teoria científica", o autor cita Gene Callahan (2):
«Actualmente, a crença dominante é a de que qualquer ciência verdadeira deve ser composta de modelos matemáticos, modelos que produzam previsões quantitativas sobre uma qualquer colecção de eventos baseados em condições particulares iniciais, também elas especificadas numericamente. Mais uma vez, a metodologia popular corrente foi imposta a diversas disciplinas com pouca consideração sobre se é ajustada ao respectivo conteúdo, simplesmente porque é considerada como o único modo respeitável de fazer ciência. O filósofo John Dupré designa isto como 'imperialismo científico', querendo significar 'a tendência para que uma ideia científica de sucesso seja aplicada muito para além do seu território de origem, e geralmente com um sucesso decrescente à medida que a respectiva aplicação é alargada' (3).»
(1) - "o próprio processo de seleccionar e analisar os factos, simplificando e removendo a confusão" - McConnell e Brue, "Economics".
(2) - "Scientism Standing in the Way of Science: An Historical Precedent to Austrian Economics" (2005)
(3) - macacos me mordam se isto não é o Princípio de Peter da metodologia científica!

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