Zack Lynch, do "Neurosociety Institute" (Califórnia, EUA), tem-se dedicado à divulgação das implicações sociais de neurotecnologia, nomeadamente através do seu blog BrainWaves. Num paper que teve a gentileza de nos enviar, "Neurotechnology and Society", Zack Lynch analisa as implicações para a sociedade da convergência das tecnologias "nano-bio-info-cogno", abreviadamente NBIC (1).
Assumindo os ciclos longos (50 anos) de mudança tecno-económica, estaríamos na fase final da 5ª onda desde o início da revolução industrial, correspondente ao ciclo de difusão da tecnologia da informação. A próxima onda será a da neurotecnologia: "o conjunto de ferramentas que pode manipular o sistema nervoso central dos humanos, especialmente o cérebro".
Os primeiros ciclos, ou ondas de inovação, que Lynch apresenta aqui, foram:
1770-1830 - mecanização da águaA neurotecnologia nascente "está a ser acelerada pelo desenvolvimento de nanobiochips e imageologia cerebral que tornarão as análises neurológicas precisas e baratas" - exactamente o que o microprocessador fez para o tratamento de dados. Entre as aplicações previsíveis estarão "a melhoria intencional da estabilidade emotiva, das actividades cognitivas e a extensão das experiências sensoriais". Poder-se-ão prever igualmente combinações com tecnologias complementares em novos sectores como a neuro-finança.
1820-1880 - ferrovia e distribuição
1870- 1920 - electrificação
1910-1970 - "motorização" da economia industrial
1960-2020 - tecnologia da informação
Como em qualquer outro desenvolvimento tecnológico, advirão oportunidades mas igualmente ameaças. Por um lado surgirão curas para os disturbios mentais e novas oportunidades para o crescimento económico e o florescimento cultural. Por outro lado poderá ocorrer a "manipulação mental com fins coercivos ou deletérios, como o apagamento selectivo da memória".
A medicina e a farmacologia beneficiarão igualmente destas tecnologias; surge aqui o conceito de neurocêuticos, que poderão ser classificados em três categorias:
Zack Lynch antecipa que os agentes económicos poderão ser equipados com "sistemas emocionais de previsão que lhes proporcionarão feed-back instantâneo acerca das suas inclinações emocionais esperadas, relativamente a um dado negócio. Por forma a reduzir os erros de previsão, emoticêuticos impedirão os agentes de evoluir para estados emocionais "quentes" que podem provocar decisões menos adequadas".cognicêuticos - focados nos processos de tomada de decisão, aprendizagem, atenção e memória; emoticêuticos - para influência dos sentimentos, estados de espírito e motivação; sensocêuticos - que podem ampliar as nossas capacidades sensoriais.
É um tema muito interessante. Existem muitos exemplos de como as novas tecnologias proporcionam inicialmente produtos muito toscos (recordem-se os primeiros automóveis) e aparentemente pouco promissores. A imageologia cerebral e a investigação do funcionamento do cérebro - e até mesmo a neuroeconomia - parecem distantes duma aplicação prática, embora se apresentem promissores para a "explicação pura" dos fenómenos mentais - mas não deve faltar muito para que possamos adquirir um gadget ou embalagem dum produto banalizado a partir destes desenvolvimentos científicos.
Tudo isto é, ao mesmo tempo, fascinante e perturbador. Os amantes de livros e filmes utilizam as obras literárias e cinematográficas com prazer, mas temos de folhear muito papel e piscar muito os olhos no escuro até encontrarmos aquelas raras obras que nos emocionam profundamente. Será que um dia encontraremos esses estados cognitivos e emocionais à venda na loja da esquina ?
(1) O acrónimo NBIC (Nano-bio-info-cogno-) também aparece escrito,em páginas de lingua espanhola, como: "BING (Bio, Info, Nano, Gno)", existindo mesmo um blogue vocacionado para as tecnologias emergentes com esse nome: BING (Bio, Info, Nano, Gno)
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