É Vasco Pulido Valente quem, na sua diatribe de hoje no Público, chama muito justamente a atenção para a ilusão de que os "independentes", nos Governos, poderiam dispensar, por via da sua competência técnica, a necessidade de competência política. O que ele escreve é: "o recurso à 'independência' passa hoje por virtude. Infelizmente, essa virtude admite o desprestígio e a inutilidade dos partidos. Pior ainda: confunde a competência técnica do funcionário ou do professor com a competência específica do político".
Veja-se o caso do indigitado ministro das Finanças e da sua entrevista referida no post anterior. Teria ele consciência das reais repercussões das suas declarações? A comunicação para a "opinião pública" (por intermediação dos meios de comunicação) não é a mesma coisa do que uma comunicação académica para os seus pares.
De acordo com o Público, Luís Campos e Cunha terá dito que não irá aumentar impostos, pelo menos para já; primeiro tentar-se-ão outras medidas, e se não forem suficientes, seguirá o aumento de impostos, eventualmente.
Escrito assim parece uma coisa ajuizada. Mas não sabia o sr, professor que raciocínios desta natureza nunca chegam assim ao público? As rádios e jornais salientam sempre a frase de maior impacto, a qual irá ocupar dramaticamente as capas dos jornais e a abertura dos noticiários. Quem é que vai depois ler o detalhe da notícia (tal como cantava o Caetano Veloso nos idos de 60 : "quem lê tanta notícia?").
Para a referida notícia, o Público ouviu outros técnicos, como Teodora Cardoso e Mira Amaral, que acharam o raciocínio de Camps e Cunha interessante: mas tratam-se de pares e, ao que parece, também simpatizantes deste governo central (Mira Amaral esteve até nas Novas Fronteiras). Teodora Cardoso até comentou: "estou convencida de que ele estava a falar como economista." Pois estaria, só que ele agora não é economista: é político!
São legítimas as suspeitas de que o sr. professor Campos e Cunha não tem a tal experiência política a que se refere Vasco Pulido Valente.
Já referi a inoportunidade de anunciar medidas antes da discussão do programa de Governo no Parlamento. Mas também me choca o estilo "experimentalista" do professor: primeiro vai tentar de uma maneira, depois, se não resultar, vai tentar uma solução mais dura. Isto faz evocar várias coisas
Mas, provavelmente, não é nada disto e apenas falta de experiência política - mas isso é talvez o mais grave: mais do que as soluções técnicas ideais, o que conta em política é a capacidade de liderança e de motivação das pessoas. Manifestações de insegurança e de inexperiência não motivam ninguém - a não ser os lóbis que vão logo pensar: "este já cá canta".uma ameaça: vocês levam agora um tabefe, se não resultar levam depois uma reguada; uma confissão de insegurança: vamos tentar esta solução; se não der, tentamos depois outra; uma brincadeira: assustamo-vos agora, depois dizemos que era "a brincar"; uma tentação: é só para ver como reagem
O sábio Sócrates conseguiu formar governo sem (grandes) fugas de informação; isso foi muito (porque já estávamos desabituados) e foi pouco (porque em si é irrelevante). A mesma contenção e seriedade deveria ter sido seguida para o programa de Governo. Será que os ministros já tiveram tempo para discutior em conjunto o respectivo programa? Campos e Cunha já ouviu os seus colegas de Governo? Como pode anunciar medidas que a todos dizem respeito, se ainda não foram votadas em conjunto?
2 comentários:
excelente comentário. um pedido:não deixar morrer este assunto e voltar a carga sempre que se justifique. suspeito que com vários dos membros deste governo isso se justificará...
:) http://economia123.blogspot.com
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