A professora Maria Filomena Mónica, a quem "passaram as dores de cabeça" depois de ter publicado o seu Bilhete de Identidade, dá uma entrevista aos "pontos nos ii", a revista mensal de política educativa que é hoje distribuída com o jornal "Público". Nesta entrevista a professora revela que foi «ao leccionar no [período] pós-Revolução que me senti pior. Os alunos queriam mandar nos professores e estes não foram capazes de dizer "o que quereis não faz sentido". Instalou-se o laxismo e abandonou-se o trabalho individual. Os professores, mesmo os catedráticos, cederam. Um grupo de quatro alunos tinha quatro disciplinas feitas: cada um fazia um trabalho, supostamente de grupo.» No seu livro "Bilhete de Identidade", Maria Filomena Mónica já tinha referido a irracionalidade do período em que os alunos tomaram conta das universidades (e dos programas, da avaliação, etç.) . Nada disto é novo, a não ser o facto de MFM assumir que também os professores se deixaram ir na onda das "facilidades revolucionárias". Hoje, há muitos desses professores que denunciam essa situação (vide o professor Cavaco Silva na sua auto-biografia política, que ridiculiza os alunos de Económicas que tinham "assento" no Concelho Científico) mas esquecem-se sempre de dizer que não tiveram a coragem de denunciar a situação na devida altura. A propósito, aproveito para contar um dos episódios, passado comigo neste contexto, que mais me penalizaram. Vem a propósito porque um dos participante foi o professor Afonso Barros - que foi casado com Maria Filomena Mónica e é profusamente citado no seu livro. O professor Afonso de Barros era da oposição ao regime muito antes do 25 de Abril. Depois da Revolução esteve ligado ao MES. Também ele apoiou a metodologia do trabalho em grupo, que era apresentada como uma alternativa aos métodos de ensino e avaliação "selectivos" que, supostamente, tinham a "marca de classe" do regime ditatorial. Mas o professor não estava preparado para o radicalismo que dominou a "classe" discente naquele ano de 1975. Fui um defensor da avaliação contínua e do trabalho em grupo, mas não me "aproveitei" dessa metodologia para passar sem estudar, embora no meu grupo de trabalho o desempenho dos elementos fosse desigual e existisse uma "protecção" aos menos diligentes no estudo. Ora, numa reunião do professor Afonso de Barros com o meu grupo, no final de uma discussão de um trabalho, ele pretendeu dar notas diferentes aos elementos do grupo, de acordo com a sua apreciação dos conhecimentos de cada um. Mas o grupo não aceitou: a nota tinha de ser igual para todos! O professor bem argumentou que era evidente que havia diferentes níveis de desempenho pelos alunos, mas o grupo foi inflexível: então ele que desse a nota mais baixa a todos os elementos. Como se explica esta irracionalidade, que prejudicava os alunos que poderiam ter nota mais elevada, que era o meu caso e do meu colega José Luis Lança? Muito simplesmente porque eramos os parolos daquele processo. Acreditávamos piamente que era mais justo todos terem nota igual, que a nota diferenciada era uma coisa do ensino burguês, bla, bla, bla... Este radicalismo é algo que hoje me envergonha - embora no ano seguinte, em 1976, eu já tenha aceitado notas diferenciadas dentro do grupo. No entanto, o mais grave daquele episódio estava para vir: como nenhuma das partes cedesse, o grupo abandonou a sala, numa bravata irresponsável. Que grandes "revolucionários"! Íamos já no jardim da escola quando Afonso de Barros veio a correr atrás de nós, e admitiu finalmente dar-nos nota idêntica a todos. Logo naquele momento, senti vergonha de termos obrigado o professor a ceder, porque ele se manifestou um cavalheiro - quem o conheceu sabe como era educado - enquanto que nós nos portámos como uns seres intolerantes. Nunca mais me esqueci deste episódio e envergonho-me dele sempre que o recordo. Poderia haver alguma compreensão para a ocorrência destas asneiras no período revolucionário, mas a fraude mantém-se no nosso sistema de ensino, conforme explica MFM: «[O ensino hoje está] mal a todos os níveis e a responsabilidade é dos partidos, em última análise, mais da direita. O pensamento progressista que irrompeu na esquerda era normal. A tradição de Rousseau e do mito do bom selvagem, tudo era normal. E a direita engoliu as balelas pedagógicas. Sendo eu de esquerda, penso que o PPD, de uma forma acrítica, aceitou todos os disparates. Nos últimos dez anos apareceram pessoas a defender a aprendizagem, o esforço e o trabalho. [Mas] ainda não se chegou aos programas, que são um disparate total, tanto na literatura como na história.» |
terça-feira, janeiro 10, 2006
Maria Filomena Mónica
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário